A 2957ª Sessão Plenária do Conselho Estadual de Educação de São Paulo foi marcada por debates relevantes e pela presença ilustre do professor Eduardo Deschamps, ex-presidente do Conselho Nacional de Educação e referência nacional nas discussões sobre o Novo Ensino Médio.
A sessão teve início com os trâmites regimentais habituais: aprovação da ata da reunião anterior, registro de ausências justificadas e informes institucionais. Foram sorteados novos processos a serem relatados nas Câmaras de Educação Básica e Superior, além da indicação de especialistas para instruções técnicas. Também foram comunicados os pareceres aprovados em regime de delegação, incluindo processos de renovação de reconhecimento de cursos de instituições como a UNESP, a Fatec Pompeia, a Universidade de Taubaté e a USP.
Superadas as formalidades iniciais, a presidente Maria Helena Guimarães de Castro assumiu a condução dos trabalhos e destacou a importância do momento: receber o professor Deschamps para uma reflexão profunda sobre os rumos do ensino médio brasileiro.
A fala de Eduardo Deschamps
Em sua exposição, Deschamps trouxe um relato histórico e crítico sobre a trajetória da reforma do ensino médio no Brasil. Recordou que o debate ganhou força em 2012, quando os indicadores de aprendizagem e evasão escolar revelaram um quadro preocupante: grande parte dos alunos não conclui o ensino médio, e entre os que concluem, muitos não demonstram aprendizagem satisfatória, sobretudo em matemática.
Citando o professor Chico Soares, Deschamps relembrou que o ensino médio brasileiro ainda é feito “para poucos”. Dos que chegam a esta etapa, muitos não permanecem, e entre os que permanecem, uma parcela significativa não encontra sentido no que aprende. Essa desconexão entre currículo e realidade juvenil foi apontada como um dos grandes motores da reforma.
O palestrante também compartilhou experiências pessoais, como a trajetória de seu filho, cuja formação artística fora do currículo tradicional foi decisiva para ingressar em uma universidade norte-americana. Esse exemplo reforçou a necessidade de um ensino médio que dialogue com os interesses, talentos e projetos de vida dos estudantes.
O desafio da implementação
Deschamps destacou que o marco legal de 2017 previa uma implantação gradual, com cronograma até 2024. No entanto, o processo foi interrompido e sofreu mudanças sem que houvesse avaliação consistente da implementação inicial. Tal cenário, segundo ele, impõe aos Conselhos Estaduais a tarefa desafiadora de revisar normas em prazo curto, buscando equilibrar diretrizes nacionais com as especificidades locais.
Um dos pontos centrais abordados foi a redução da Formação Geral Básica de 2400 para 1800 horas, medida inspirada em experiências internacionais e defendida como alternativa para tornar o currículo menos fragmentado e mais significativo. A ideia seria reservar espaço para os itinerários formativos, permitindo trajetórias personalizadas de acordo com as aspirações dos estudantes.
Entretanto, Deschamps ressaltou que essa mudança só faria sentido se acompanhada de adaptações no Enem e no SAEB, o que ainda não ocorreu, mantendo as escolas presas a um modelo enciclopédico e pouco efetivo.
Questões normativas e curriculares
Outro destaque da exposição foi a análise sobre o papel dos Conselhos Estaduais na definição de normas complementares. Deschamps lembrou que a legislação brasileira garante autonomia aos sistemas de ensino, e que cada estado pode interpretar e aplicar as diretrizes de acordo com sua realidade. Citou como exemplo a diferença entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul quanto à necessidade de homologação das normas pelo poder executivo.
Entre os temas polêmicos, estiveram a obrigatoriedade de determinados componentes curriculares, como Educação Física e Artes, e a inclusão da Educação Digital como área obrigatória, aspectos que, segundo ele, exigem cautela para evitar engessamentos e permitir inovação.
Sobre o Projeto de Vida, o palestrante observou que, embora obrigatório por lei, cabe a cada sistema decidir se será tratado como disciplina específica ou como eixo transversal. Já em relação aos itinerários formativos de aprofundamento, reforçou a necessidade de regulamentação clara para garantir que as escolas ofereçam percursos consistentes, sem inviabilizar experiências inovadoras
Um olhar para o futuro
Ao final, Deschamps reiterou que a reforma do ensino médio deve ser entendida não como um ponto de chegada, mas como um processo em construção, sujeito a revisões e aprimoramentos. Destacou que o papel dos Conselhos Estaduais é estratégico, pois cabe a eles mediar entre a legislação nacional e as realidades diversas do território brasileiro.
A presidente Maria Helena reforçou a fala do convidado, lembrando que estudos comparativos internacionais já apontavam há anos o caráter fragmentado e superficial do currículo brasileiro, e que a transição para um modelo mais conciso e conectado com a vida dos jovens é urgente.
Conclusão
A 2957ª Sessão Plenária reafirmou o compromisso do Conselho Estadual de Educação de São Paulo com o debate público e transparente sobre os rumos da educação. A palestra de Eduardo Deschamps não apenas resgatou a memória da reforma, mas também iluminou os dilemas atuais e futuros do ensino médio, convidando conselheiros, gestores e educadores a refletirem sobre como garantir que esta etapa da educação básica cumpra sua função formativa e social.